segunda-feira, 28 de julho de 2008

Notas de andaime

De cima do andaime é de onde se vê o quão a vida humana é completamente sem sentido, ou melhor, de cima do andaime é onde se pensa que a vida humana é destituída de sentido. Os homens parecem ainda mais pequeninos vistos desse ponto de vista, ponto de vista que está entre o imanente e o transcendente, a meio caminho de um e de outro. O andaime é imanente na medida em que sua base é o chão; é transcendente, pois ficamos suspensos lá em cima vendo pequenos homens passarem apressados com destino ao fim, mulheres bonitas e gostosas a caminho da decrepitude...

Daí vista da vida somente importa o valor biológico: uma fêmea reprodutora e só. Às fêmeas que passam perto da obra as chamamos “gostosas”, sem nenhum pudor; mas isso é porque sabemos que nunca as possuiremos, pois se tivéssemos essa intensão teríamos de ir se achegando de mansinho. Levamos a vida possuindo o que podemos com a miséria que ganhamos – até acho divertido a eterna arte de se virar, se há algo que pode dar sentido à vida é o “se virar”. Quando recebo o pagamento da obra a primeira coisa que faço é tomar algumas cervejas no bar do meio e fumar cigarros caros, mesmo que depois terei que fumar trevo e tomar cachaça os outros vinte e tantos dias do mês. Isso é que é dizer sim à vida!


Filho ainda não tenho, mas sinto a necessidade de um herdeiro para minha pedreiragem, assim como meu pai sentiu tal necessidade. Por certo não é uma vida má, tem seus altos e baixos – os ossos do ofício. Mas que atividade não é assim? Desconfio que bater picareta é algo bem mais fácil que estar trepado num andaime o dia inteiro. Nada cai do céu: até para cagar tem que se fazer uma forcinha.


Ouvi dizer pela boca de um amigo de obra, um cismado que é poeta (todo mundo chama-o “Poeta”), que outro poeta disse a certa altura que o homem precisa fazer três coisas na vida: plantar uma árvore, escrever um livro e ter um filho. Mas pensando bem, falta aí algo que um homem precisa fazer na vida, a mais sublime da atividades: bater uma lajem. É o ponto máximo da vida pedreira; quando se junta aquele bando de homens para falar besteiras como nunca, mexer com as coitadas que dão o azar de passar na rua onde estão trabalhando. Sem falar que no desfecho ainda tem uma feijoada, ou um pão com miúdos de porco, uma pinga da boa e cerveja adoidado, além de risadas.

Um comentário:

Rafael Andrade disse...

HAHAHAHHAHA, esssssssssssses amigos pedreiros!!! Hail to the colher de pedreiro!